GUARDAS MUNICIPAIS: Uma nova polícia com uniforme azul marinho?
Autor: Francisco Sérgio da Silva Evangelista - Pós Graduado em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Pós Graduado em Policiamento Comunitário e Subinspetor da GMF há 33 anos.

As Guardas Municipais mimeterizaram o modelo militar, inclusive com unidades especializadas de "caveiras" e seus pelotões de choques. Poucas trabalham com metodologia focada na prevenção da violência e na criminalidade, isto é, com postura de aproximação e comunicação com as comunidades locais, desse modo, a participação social não acontece. Infelizmente, o fenômeno do isomorfismo institucional dentro das Guardas Municipais de todo país é muito forte, tais Instituições sofreram influência formais e informais das Polícias Militares. Um exemplo destas influências são os regulamentos disciplinares, nas hierarquias, nos modelos de fardamentos, nos modus operandi e nos cursos de formação, mais a frente comentaremos sobre as metodologias usadas em alguns cursos de formação para guardas municipais. Alguns estudiosos acreditam que as fortes influências do militarismo dentro das Guardas Municipais brasileira foram por serem comandadas até hoje por coronéis da polícia militar e do exército brasileiro, concordo, no entanto, as Guardas Municipais também foram comandadas por civis, como por exemplo; advogados, professores e funcionários públicos indicados por apadrinhamentos políticos, que até hoje, mesmo com a Lei 13.022 de 08 de agosto de 2014(Estatuto Geral das Guardas Municipais), que as regulamentou, deixando claro quanto à nomeação para o cargo de diretor geral e adjunto, só servidores de carreira da Instituição. Porém, a indicação política continua sendo o principal critério para as nomeações, mesmo que os nomeados sejam servidores de carreira, ainda não existe uma regulamentação quanto os critérios técnicos ou por antiguidade para as nomeações, infelizmente, é a política que define tais critérios. Voltando aos gestores civis, foram nas gestões deles que algumas Instituições mais ganharam status militares, com regulamentos disciplinares, em que um subordinado deve prestar continência aos seus superiores, a não obediência, resulta em punições.
Hoje, os guardas municipais fazem um trabalho reativo e ostensivo desarmados nas ruas e avenidas das grandes capitais colocando suas vidas em risco em proteção do cidadão, precisa ter muito sangue azul para exercer tamanha missão, pouquíssimas trabalham armadas com arma de fogo. Observando o processo de institucionalização das Guardas Municipais brasileiras, é constatado que algumas delas têm o papel de vigilância e preservação de bens e serviço municipal, outras, no entanto, segundo a Lei 13.022 de 8 de agosto 2014 (Estatuto Geral das Guardas Municipais), conforme seu INCISO III do seu ARTIGO 5°, permitem às Guardas Municipais fazerem um policiamento ostensivos nas vias públicas, isto é, exercendo um papel de polícia municipal de natureza ostensiva, de tudo faz um pouco, que vai desde a fiscalização do trânsito local, vigilância patrimonial, monitoramento, policiamento ambiental, ronda escolar, serviço de salvamento, pelotão de choque, policiamento ostensivos e entre outras missões. Porém, conforme Ação Direta de  Inconstitucionalidade de número 5156, a citada lei está sendo questionada no Superior Tribunal Federal (STF). Atualmente, temos Guardas Municipais que ora são ostensivas, porém, não se faz um trabalho reativo desarmado e outras que se diz preventiva, no entanto, não se faz um trabalho proativo sem a participação das comunidades locais. Do modo pelo o qual as atividades são exercidas hoje pelas as Guardas Municipais de todo país, salvo algumas exceções, a tal sonhada construção da identidade organizacional fica distante e impossível.                       
“SE NÃO AGUENTA" SAIR AGORA! Um constrangimento desnecessário.
Uma reflexão sobre os cursos de formação para os guardas municipais de todo país.
A herança do militarismo presente nas Guardas Municipais de todo Brasil colocou essas instituições distante de criarem uma identidade organizacional voltada para uma segurança pública preventiva, integrada e com a participação da comunidade local. O fenômeno do isomorfismo institucional dentro das Guardas Municipais de todo país é muito presente, um exemplo desta influência são  observados nos cursos de formação. Os guardas municipais, ao participarem dos cursos de formação ou de aperfeiçoamento profissional, eles recebem dos seus instrutores uma socialização baseada numa cultura militarista, com valores para o confronto ostensivo nas ruas e com o lema “força e superação”. Como veremos em alguns relatos retirados das redes sociais e pessoalmente, a "pedagogia do sofrimento" adotada por alguns instrutores nos cursos de formação dos guardas municipais monstra claramente a influência do militarismo, muitos instrutores pertencem ao quadro funcional dessas Instituições, que também receberam os mesmos treinamentos. Vejamos agora alguns relatos retirados das redes sociais de guardas municipais sobre os cursos de formação: “Um guarda municipal relatou que no curso de ordem unida, o instrutor que também era guarda municipal pediu para que um aluno colocasse em formação todos os outros alunos, porém, o xerife (aluno) do pelotão, não soube colocar todos em ordem unida, receberam como castigo que tirassem a cobertura e ficasse de frente para o sol por um bom tempo, segundo a guarda, o instrutor dizia que ” Quem não aguenta, sai ".  Outro relato é de uma guarda, segundo ela, “um instrutor, fez um pelotão de alunos beber uma Coca-Cola na mesma garrafa. “Todos deram um gole na boca da mesma garrafa” Outro relato retirado das redes sociais sobre o que acontece nos cursos de formação, um instrutor, que também era guarda municipal colocou um pelotão de guardas alunos dentro de um quarto escuro e no interior do mesmo colocou bastante spray de pimenta e dizia " Quem não aguentar, sai".
Por fim, com todo esse militarismo dentro dos cursos de formação dos guardas municipais de todo país, só revela como essas Instituições são resistentes quanto às tentativas de mudanças que estão sendo implantadas desde 2004 com a criação da SENASP-MJ (Secretaria Nacional de Segurança Pública), como o PRONASC e a MATRIZ CURRICULAR NACIONAL para a formação dos guardas municipais com caráter predominante comunitário e preventivo, baseados como metas; o aperfeiçoamento e a capacitação não militarista, isto é, basta de submissão e do acatamento irrestrito ao superior hierárquico. Precisamos de Guardas Municipais com a concepção de segurança pública proativa, preventiva, integrada, com planejamento de longo prazo e com o foco no trabalho comunitário. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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